Finanças para Médicos

Série Finanças para Consultórios: Gestão Financeira Eficiente

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Você precisa saber a interrelação entre lucro e o aumento do patrimônio líquido. Aprenda a determinar a eficiência da gestão de seu consultório.

EDUCAÇÃO FINANCEIRA PARA MÉDICOS
dos primeiros passos ao primeiro milhão

Francinaldo Lobato Gomes *

 

A GESTÃO FINANCEIRA ESTÁ SENDO EFICIENTE?

 

INTRODUÇÃO

O fato de o consultório dar lucro não significa que esteja havendo aumento adequado de seu patrimônio líquido, uma vez que a gestão pode não estar sendo eficiente na aplicação dos recursos. O principal objetivo da gestão financeira de um consultório é obter lucro e aumentar o patrimônio líquido. Além disso, como o consultório é um negócio próprio, com a mais alta relação risco/retorno do mercado, é necessário que o retorno obtido seja alto o suficiente para compensar o risco.

No Brasil, o índice usado para medir a taxa de retorno livre de risco dos investimentos é a taxa SELIC (Serviço Especial de Liquidação e Custódia), que representa a taxa básica de juros do país. A taxa SELIC mede o custo médio do dinheiro para as transações entre o governo e o sistema bancário. A taxa SELIC é utilizada como referência para os investimentos em renda fixa.

Qualquer modalidade de investimento de risco deverá trazer rendimento maior que 11,25% ao ano para que valha a pena

Atualmente a taxa SELIC está em 11,25% ao ano. Isto quer dizer que um investimento em renda fixa renderá cerca de 11,25% ao ano, com risco baixíssimo. Portanto, qualquer modalidade de investimento em que haja risco maior deverá trazer rendimento maior que 11,25% ao ano para compensar o risco. E, no caso de um negócio próprio, este retorno precisa ser ainda maior, porque o risco é o mais alto do mercado. Não existe um valor padrão de retorno esperado para um negócio próprio, mas é aconselhável que o retorno esteja acima do retorno obtido com a renda fixa, ou seja, acima de 11,25% ao ano para compensar o risco. Quanto mais acima da taxa básica de juros, melhor para o consultório, pois demonstra maior eficiência na gestão financeira dos recursos.

 

COMO SABER SE MEU CONSULTÓRIO TEM BONS RESULTADOS? 

Para saber se o consultório está dando retorno satisfatório, o médico precisa conhecer o Retorno Sobre o Patrimônio Líquido (RSPL) e a Margem Líquida (ML) do seu consultório.

Obtém-se o RSPL dividindo-se o lucro líquido pelo patrimônio líquido e multiplicando-se o resultado por 100 para obter o percentual. Quanto maior o RSPL, mais eficiente a gestão está sendo na aplicação dos recursos.

Tomemos como exemplo os dados presentes no texto sobre as demonstrações financeiras.

O RSPL do consultório em questão será de 13,54% (108.360,00/800.000,00). Ou seja, o RSPL está um pouco acima da taxa SELIC. Isto quer dizer que a gestão financeira deste consultório, apesar de estar conseguindo lucrar, não está sendo tão eficiente assim.

Diante deste resultado, o médico precisa detectar onde está(ão) o(s) problema(s) e corrigi-lo(s) o quanto antes para melhorar a eficiência.

 

DETERMINANDO AS CAUSAS DA MÁ EFICIÊNCIA 

Uma causa provável é a taxa de ocupação. No caso do exemplo utilizado (ver texto no link abaixo), vemos que o consultório em questão tem 24.000 minutos disponíveis, mas usa 19.000 minutos. Assim, a taxa de ocupação é de 79%. Com esta taxa de ocupação, percebe-se que há horários livres que não estão gerando lucro, mas que estão gerando gastos. Como as consultas de convênio são mais lucrativas para este consultório, seria aconselhável ocupar os horários com as consultas de convênio.

Relembre o texto: “Quanto vale uma Consulta?

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Por exemplo, se acrescentarmos mais 100 consultas de convênio ao mês, a taxa de ocupação sobe para 87,5%, o lucro anual sobe para R$ 132.000,00. Consequentemente, o RSPL sobe para 16,5% ao ano. Se acrescentarmos mais 200 consultas de convênio ao mês, a taxa de ocupação sobe para 95,8%, o lucro anual sobe para R$ 156.000,00. Consequentemente, o RSPL sobe para 19,5% ao ano. Portanto, apenas aumentando a taxa de ocupação do consultório, a gestão conseguiu melhorar significativamente o RSPL.

Outra forma de melhorar o RSPL é aumentar a lucratividade do consultório. Isto pode ser feito aumentando o valor da consulta ou reduzindo os gastos da mesma. Deve-se considerar, por exemplo, reduzir o número de funcionários, renegociar valores de aluguel, condomínio e avaliar mudar para outro consultório com custos mais baixos.

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Os horários disponíveis também podem ser disponibilizados para profissionais de outras áreas sob a forma de aluguel, ou até mesmo podem ser usados para ofertar exames e procedimentos. Ainda, deve-se buscar reduzir a carga tributária por meio de um planejamento tributário eficaz.

Ainda com base nos dados disponíveis, podemos calcular a margem líquida. A margem líquida é obtida dividindo-se o lucro líquido pela receita e multiplicando-se o resultado por 100. A margem líquida informa quanto, de cada real obtido em receita, fica para o consultório. Ela significa quanto ‘de manobra’ o consultório tem com relação aos valores cobrados, para manter a lucratividade. Quanto maior a margem líquida, melhor para o consultório.

O conhecimento da margem líquida é muito importante em períodos de crises em que, muitas vezes, é necessário reduzir a lucratividade para manter a competitividade.

No caso do consultório acima, temos que o lucro líquido anual é de R$ 108.360,00 e a receita anual é de R$ 780.000,00. Portanto, a margem líquida é de 13,9%.

Tal como ocorre com o RSPL, não há um valor padrão de margem líquida. No entanto, para um negócio próprio na área da saúde, considera-se que a margem deva estar acima da taxa de juros do país e, quanto maior, melhor.

 

A margem líquida

No consultório em questão, podemos ver que a ML de 13,9% está pouco acima do ideal. Isto significa que, se o consultório passar por dificuldades financeiras e precisar reduzir o preço de seus serviços, ele não terá tanta margem de manobra para manter sua lucratividade em nível adequado e poderá incorrer em prejuízo.

Reparem que o acréscimo de 100 consultas de convênio eleva a ML para 15,7% e o acréscimo de 200 consultas de convênio eleva a margem para 17,33%. Portanto, a melhora na taxa de ocupação deste consultório melhora tanto o RSPL quanto a ML. Melhor de tudo: para implementar estas mudanças, não é preciso aumentar os gastos, pois será otimizada a estrutura e o uso dos funcionários e equipamentos já existentes.

Assim, podemos dizer que este consultório está sendo lucrativo, porém sua gestão não está sendo tão eficiente quanto poderia. O simples fato de aumentar a taxa de ocupação já melhora significativamente a eficiência da gestão financeira do consultório.

criança simulando uma consulta médica

 

CONSULTAS DE CONVÊNIO vs CONSULTAS PARTICULARES

No exemplo citado, as consultas de convênio estão sendo mais lucrativas para o consultório do que as consultas particulares. Então, para o consultório, parece ser bem mais interessante preencher os horários disponíveis com pacientes de convênio do que com pacientes particulares.

O raciocínio está correto, mas deve-se levar em conta alguns aspectos. Primeiramente, o pagamento das consultas de convênio costuma ser feito com atraso de cerca de três meses, enquanto o recebimento das consultas particulares costuma ser feito em bem menos tempo (algumas vezes até no mesmo dia). Como o valor do dinheiro diminui com o tempo por conta da taxa de inflação, a lucratividade das consultas de convênio e das consultas particulares pode não ser tão diferente.

As glosas

Outro aspecto a ser levado em conta são as glosas. Consultas particulares não costumam ter glosas, enquanto as consultas de convênio costumam ter um certo percentual de glosas, reduzindo o valor médio pago por consulta e, portanto, a lucratividade obtida. Neste caso, é preciso ficar atendo ao faturamento de cada tipo de consulta para evitar as glosas.

Com relação às glosas, todos os profissionais envolvidos no funcionamento do consultório deverão estar atentos a detalhes importantes dos processos de faturamento e cobrança dos honorários. Usualmente, as glosas resultam de problemas de comunicação entre o consultório e o convênio a respeito do atendimento prestado. Abaixo coloco algumas orientações a serem seguidas para evitar ou reduzir o número de glosas.

  • Na guia de honorário deverão constar nome, matrícula e assinatura do paciente; data e hora do atendimento; carimbo e assinatura do profissional; CID ou nome da patologia referente ao atendimento;
  • Em qualquer pedido e na solicitação de autorização de procedimento médico deverão constar o nome do paciente, o nome do convênio, a data do atendimento, o código do procedimento (conforme tabela), a descrição do atendimento, o carimbo e a assinatura do profissional e o CID ou o nome da patologia referente ao atendimento;
  • Não se deve rasurar as guias de atendimento, as solicitações de exames e/ou os procedimentos, bem como as autorizações emitidas pelos convênios.

CONCLUSÃO 

Para concluir, o médico precisa entender que nós não vivemos mais nos Jardins do Éden, onde os recursos eram infinitos. Vivemos num mundo de escassez e, por conta disso, os recursos devem ser aplicados da forma mais eficiente possível para evitar o desperdício.

A avaliação da eficiência da gestão financeira por meio do RSPL e da ML permite avaliar se o consultório está otimizando os recursos, se está gerando valor e aumentando, de forma satisfatória, o patrimônio líquido. Apenas aumentando o patrimônio líquido de forma consistente é que o consultório tornar-se-á sustentável.

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Dr. Francinaldo Gomes

Neurocirurgião. Mestre em Neurociências. Autor dos livros "Bolsa Valores para Médicos" (Editora DOC, 2012) e "Finanças no Consultório: como Maximizar os Resultados" (Editora DOC, 2016). Escritor da coluna "Investimentos" da revista DOC e da revista SBN Hoje. Especialista em investimento em ações e mercado de opções (CMA Educacional). MBA em finanças com ênfase em gestão de investimentos (FGV). Membro da Comissão de Apoio, Qualificação e Gestão Empresarial da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia.
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