Novas vacinas para febre amarela e esquistossomose a caminho
Pesquisas desenvolvidas na Fiocruz abordam novas estratégias para combater ambas as doenças, de enorme impacto social e econômico no Brasil e no mundo.
No último mês, dia 25, o Brasil deu início à maior campanha de vacinação contra febre amarela utilizando doses fracionadas de todos os tempos, em todo o mundo. Organizada com a ajuda da Organização Panamericana de Saúde e da Organização Mundial de Saúde (OMS), a campanha pretende imunizar pelo menos 20 milhões de pessoas nas próximas semanas.
Em meado de fevereiro, a campanha deve chegar também à Bahia, com o objetivo de vacinar 3,3 milhões de pessoas adicionais.
Este é apenas o início de uma meta ambiciosa do governo: passar a vacinar a maior parte da população rotineiramente contra a febre amarela, uma doença potencialmente mortal, que ainda impacta centenas de pessoas todos os anos e que é propensa a surtos e epidemias, como a que vivenciamos atualmente.
A seguir, analisamos a estratégia atual do governo para vacinar a população e apresentamos as novidades que prometem facilitar o combate à febre amarela nos próximos anos.
O USO DA DOSE FRACIONADA: VALE A PENA?
Na atual campanha de vacinação, 1/5 da dose habitual é administrada aos pacientes.
Esta concentração é meramente uma maneira de estender os estoques da vacina ao máximo, permitindo que uma ampola dure 5x mais. Em tempos de crise, a própria OMS recomenda seu uso, a fim de manter o maior número possível de pessoas imunizadas.
As doses fracionadas promovem imunização de curto prazo, durante um período de aproximadamente 12 meses. Alguns estudos chegaram a apontar um tempo maior de imunização (até oito anos), mas ainda são inconclusivos. Diversos trabalhos mostraram que 1/10 da dose tradicional já promove efeitos imunitários significativos, mas o governo optou por usar 1/5 da dose como precaução.
As doses integrais, não fracionadas, ainda são a única estratégia aceita para imunização de longo prazo na população; aceita-se que são capazes de imunizar uma pessoa durante toda sua vida.
A VACINA ATUAL CONTRA FEBRE AMARELA É EFICIENTE? NOVAS OPÇÕES ESTÃO SENDO CRIADAS?
A vacina atualmente utilizada foi originalmente desenvolvida em 1937 e utiliza o vírus vivo atenuado. De acordo com diversos estudos, a dose integral da vacina é extremamente eficiente, gerando poucos efeitos colaterais, sendo muito bem tolerada pelo organismo e gerando imunização pela vida inteira.
O Ministério da Saúde afirma que, até o momento, ocorreu 1 reação adversa a cada 250 mil pessoas imunizadas. A taxa de reações graves é de 1 a cada 400 mil imunizações.
Mas novas estratégias estão sendo desenvolvidas aqui no Brasil para modernizar a produção de vacinas contra a febre amarela. Afinal, o uso de vírus atenuado impede que pessoas com sistema imunológico comprometido ou idosas, por exemplo, sejam vacinadas com segurança.
A Fiocruz, em suas sedes em Pernambuco e no Rio de Janeiro, trabalha atualmente em duas novas gerações da vacina, utilizando apenas o material genético do vírus ou o vírus inativado. De acordo com o cronograma do instituto, elas poderão ser aprovadas para uso dentro de uma década.
Além de permitirem que pessoas imunocomprometidas recebam doses da vacina, as novas estratégias prometem acelerar o tempo de produção. Atualmente, a fabricação da vacina tradicional para febre amarela é considerada demorada, e seriam necessárias novas e grandes fábricas para dar conta do aumento na demanda. Por enquanto, o governo reduziu consideravelmente as exportações da vacina a fim de suprir a campanha nacional de vacinação.
O Brasil é o maior produtor global de vacinas para febre amarela. Até 2016, exportava 20 milhões de doses. Este ano, devido à epidemia da doença, a exportação deverá ser reduzida para 1 milhão de doses apenas.
PARA QUAIS GRUPOS A VACINA NÃO É RECOMENDADA?
O Ministério da Saúde não recomenda a vacinação nos seguintes grupos:
- Portadores de doenças autoimunes
- Pessoas com alergia grave ao ovo
- Mulheres amamentando crianças com menos de 6 meses
- HIV-positivos e com contagem de CD4 <350
- Em tratamento químio ou radioterápico
- Em uso de imunossupressores
O Ministério da Saúde recomenda cautela e avaliação médica prévia à vacinação para pessoas dos seguintes grupos:
- Quem passou por químio ou radioterapia recentemente
- Grávidas
- Quem utiliza corticoides
- Possui doença hematológica, renal ou hepática
NÚMERO DE CASOS DE FEBRE AMARELA NO BRASIL
- Segundo dados do Ministério da Saúde, de julho de 2016 a janeiro de 2017, foram reportados 381 casos confirmados de febre amarela, com 127 mortes associadas.
- Os números do período julho/2017 a janeiro/2018 são apenas parcialmente melhores: 130 casos confirmados, com 53 mortes.
- Em todo 2017, 777 casos foram confirmados, com 261 mortes associadas.
- O Ministério afirma ter distribuído aos estados 57.4 milhões de doses de vacinas de febre amarela em 2017.
- Veja a lista de municípios em que é recomendada a vacinação em todo o país: http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/listavacinacaofa.pdf
Guia de Repelentes PORTALPED
ESQUISTOSSOMOSE TAMBÉM PODE GANHAR VACINA EM BREVE
Não só a febre amarela está na mira dos pesquisadores. A esquistossomose, doença parasitária ainda bastante presente no Brasil, está perto de ganhar sua própria vacina.
Pesquisadores da Fiocruz e da George Washington University iniciarão em breve a Fase Ib de testes clínicos para vacina contra a esquistossomose em uma região endêmica do Brasil. Sessenta homens e mulheres habitantes da cidade de Americaninhas (MG), aonde a esquistossomose é endêmica, receberão doses da nova vacina, que tem como objetivo imunizar contra o antígeno Sm-TSP-2, característico do Schistosoma mansoni.
A esquistossomose é considerada uma das principais doenças negligenciadas em todo o mundo. Ocorre principalmente na África Subsaariana e na América Latina. No Brasil, 19 estados apresentam casos, com predominância da Região Nordeste, além dos estados de Minas Gerais e do Espírito Santo.
A doença é a segunda infecção parasitária mais mortífera no planeta, perdendo apenas para a malária. Estima-se que mais de 200 milhões de pessoas sofram de esquistossomose crônica, gerando debilidades físicas, perda de produtividade e de qualidade de vida. Destes casos, cerca de 1/3 é devido ao S. mansoni; o parasita, porém é o responsável por 50% dos casos em que há fatalidade.
“No momento, as pessoas são tratadas para esquistossomose e logo depois voltam a ser infectadas”, disse em comunicado à imprensa o Dr. David Diemert, pesquisador principal do estudo e professor de microbiologia, imunologia e medicina tropical na George Washington University. “Criar uma vacina é um passo crítico a fim de terminar este ciclo”, definiu o pesquisador.
A expectativa da Fiocruz é de que a vacina, que já está sendo desenvolvida há mais de 30 anos, fique pronta para ampla distribuição até 2020, e que a dose custe cerca de US$ 1,00.
SINTOMAS DA ESQUISTOSSOMOSE
De acordo com a Fiocruz, “A pessoa infectada pode desenvolver uma erupção cutânea ou coceira no local em que o parasita penetrou na pele. A maioria das pessoas, no entanto, não tem sintomas na fase inicial da infecção. De um a dois meses após a infecção, quando o parasita atinge o sangue e ‘viaja’ por ele, a pessoa pode sentir febre, calafrios, tosse e dores musculares. O parasita então pode passar para o fígado, o intestino ou a bexiga.”