The Lancet: estudo global identifica principais causadores da pneumonia em crianças
Vírus Sincicial Respiratório surge como responsável por mais de 30% dos casos de pneumonia severa em menores de 05 anos.
A pneumonia é uma das principais preocupações dos pediatras. Afinal, os números e as estatísticas relacionadas a ela são impactantes:
- anualmente, mais de 100 milhões de casos de pneumonia em crianças são reportados em todo o mundo, com cerca de 900 mil fatalidades confirmadas;
- a pneumonia é a principal causa de morte infantil em menores de 5 anos após o período pré-natal, correspondendo a cerca de 13% das mortes anuais nessa faixa etária;
- o impacto da mortalidade por pneumonia é maior do que a combinação das mortalidades relacionadas a malária, tuberculose, AIDS, Zika e Ebola.
Felizmente, nas últimas décadas, melhoras na profilaxia e no tratamento da pneumonia causaram uma redução significativa no número de mortes. Em 1990, quase 2 milhões de crianças faleceram por pneumonia; este número caiu para 900 mil em 2015. Ainda assim, faltam vacinas para alguns dos principais causadores da doença, o que impede que essa queda se acentue ainda mais.
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Em vista disso, o consórcio internacional “The Pneumonia Etiology Research for Child Health (PERCH) Study Group” publicou, na edição de 27 de junho de 2019 do The Lancet, os resultados de seu mais recente estudo — o maior e mais abrangente sobre pneumonia desde a década de 1980. A pesquisa analisou casos de quase 10 mil crianças em sete países na África e Ásia, e utilizou métodos estatísticos inovadores a fim de identificar as principais causas da pneumonia — e oferecer, assim, novos caminhos para combater a doença.
RESULTADOS MOSTRAM PREVALÊNCIA DO VÍRUS SINCICIAL RESPIRATÓRIO
No estudo, foram realizados testes virais, bacterianos e de demais patógenos a partir de fluidos corporais diversos de crianças de 1 a 59 meses internadas com pneumonia grave, usando como controle crianças saudáveis da comunidade.
Foram identificados 30 patógenos diferentes nas crianças internadas. Desses, cerca de 10 foram responsáveis por aproximadamente 85% dos casos em todos os sete países.
PATÓGENOS MAIS COMUMENTE ASSOCIADOS À PNEUMONIA IDENTIFICADOS NO ESTUDO
(em ordem alfabética; a prevalência de cada um variou de país em país. Apenas o Vírus Sincicial Respiratório mostrou-se como o mais prevalente em todos os sete países analisados)
Bacavirus humano
Candida spp.
Cytomegalovirus
Influenza A, B e C
H influenzae
Metapneumovirus A e B humano
Mycobacterium tuberculosis
Moraxella catarrhalis
Pneumocystis jirovecii
Vírus parainfluenza tipos 1, 2, 3 e 4
Parechovirus-enterovirus
Rhinovirus humano
Vírus Sincicial Respiratório
Staphylococcus aureus
S pneumoniae
Salmonella spp
Dos casos de pneumonia grave, 61,4% foram causados por vírus, em especial o Vírus Sincicial Respiratório (VSR). Vinte e sete vírgula três por cento dos casos estudados foram bacterianos.
O VRS foi o responsável por 31% dos casos gerais de pneumonia analisados, porcentagem mais de três vezes maior que o segundo colocado. Em todos os sete países participantes do estudo, o VRS foi identificado como a principal causa de pneumonia severa.
Trata-se de um resultado inesperado, pois estudos populacionais anteriores costumavam mostram causas bacterianas como as mais prevalentes em pneumonia. Os autores do estudo apontam que a adoção de vacinação contra patógenos bacterianos — especialmente contra o Streptococcus pneumoniae, um dos principais causadores de pneumonia — tornou-se comum, nas últimas décadas, nos países incorporados no trabalho. Ainda assim, os casos de pneumonia causada por bactérias corresponderam a significativos 25–33% dos casos analisados.
O VSR
Conforme publicado anteriormente no PortalPed, o Vírus Sincicial Respiratório é um patógeno comum e potencialmente sério, afetando crianças e adultos. O VSR é a principal causa de bronquiolite, doença que aflige os pais e que superlota os serviços de atendimento pediátrico nos meses de outono e inverno.
De acordo com o Centers for Disease Control dos EUA, o VSR é a causa número um de pneumonia em crianças com menos de um ano naquele país.
Atualmente, diversos candidatos a vacinas para o VSR estão em desenvolvimento ou em testes clínicos ao redor do mundo. Uma estratégia terapêutica com anticorpos monoclonais chamada de palivizumabe está disponível no mercado para prevenir doenças causadas pelo VSR em crianças com pré-condições médicas e alto risco de infecção, mas seu uso é bastante restrito e não está disponível para a população geral.
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REPERCUSSÕES DO ESTUDO
Maria Deloria Knoll, diretora científica do Centro Internacional de Acesso a Vacinas da Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health e uma das principais autoras do estudo, comentou os resultados: “Antes [deste estudo], nós não sabíamos quais os vírus e bactérias específicas que causam, atualmente, a maior parte dos casos de pneumonia severa em crianças no mundo”, afirmou. “Organizações de saúde pública e desenvolvedores de vacinas realmente precisam dessa informação para que possam trabalhar na redução da considerável mortalidade infantil que a pneumonia ainda causa”.
A versão online do The Lancet trouxe um comentário interessante sobre o estudo, seus resultados e limitações. O artigo “What the PERCH study means for future pneumonia strategies” pode ser acessado gratuitamente no seguinte link abaixo.
Comentário sobre os resultados do estudo no The Lancet
REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
- Causes of severe pneumonia requiring hospital admission in children without HIV infection from Africa and Asia: the PERCH multi-country case-control study. The Pneumonia Etiology Research for Child Health (PERCH) Study Group. The Lancet – June 27, 2019.
- https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(19)30721-4/fulltext